Volta e meia minha filha de dez anos pergunta quando é que ela vai poder
dirigir um carro. Quem não se lembra de torcer para o aniversário de dezoito
anos chegar logo, só para tirar a carteira de motorista? É um dos muitos ritos
de passagem na vida de um jovem. Ou pelo menos costumava ser.
Um estudo da Schroders, que é uma empresa de investimentos, aponta para
uma mudança nesta tendência na Inglaterra. Já não é de hoje que a indústria
automobilística sabe que as vendas de carros atingiram o pico nos países
industrializados (exceto a Alemanha) e mais, estes mercados apresentam sinais
que podem ser de declínio. Existem várias explicações para a mudança de
comportamento destes consumidores. Fatores culturais e sociais, impulsionados
pelo aumento do uso de tecnologia, teriam um papel importante.
Os jovens ingleses já não têm a mesma relação com o carro, que seus pais
tiveram na idade deles. O carro deixou de ser símbolo de status. De objeto de
desejo passou a ser apenas meio de transporte. O aumento de smartphones e das
mídias sociais teve um impacto profundo nesta mudança de comportamento: é mais
fácil se comunicar, ainda que virtualmente. Um estudo da Universidade de
Michigan indica que o uso maior da internet coincide com a queda do número de
jovens tirando a carteira de habilitação. Sem falar que o jovem do milênio
valoriza mais o último lançamento de um aparelho eletrônico do que um carro. As
vendas online também contribuíram para a diminuição de carros na rua. Não é
mais necessário sair de casa para fazer compras. O que se observa claramente
nas ruas inglesas, com várias lojas desocupadas, embora este seja assunto para
outro post.
Dirigir no centro de Londres não é exatamente divertido. O motorista tem
que pagar um pedágio eletrônico, chamado Congestion Charge, que custa em torno
de 55 reais por dia! Estacionamento é um pesadelo logístico: não só é raro,
como igualmente caro e, para complicar, o trânsito não anda. Mas quem precisa
dirigir em Londres com um transporte público como o deles?
Diariamente são 24 milhões de jornadas em ônibus, no metrô, trens e nos
barcos que cruzam o rio na capital inglesa. O metrô de Londres é antigo, tem
uma malha extensa e que dá sinais de cansaço, apesar dos investimentos
constantes. Toda manhã, o jornal local da BBC fala da situação do trânsito e o
funcionamento do London Underground. É rara a semana em que todas as linhas
estão funcionando sem atraso. A pontualidade britânica, no quesito
transporte público, é mais um mito urbano. Quem depende dos trens para chegar
ao trabalho sabe disso. No horário de rush, os vagões circulam lotados. Nos
poucos dias de verão, o passageiro assa nos trens. Se neva, eles param. Se está
muito quente, param também. Para quem usa todo dia, o transporte público é um
mal necessário e, como os estacionamentos, caro. Por essas e por outras (a
cidade precisa diminuir a emissão de gases de efeito estufa na atmosfera), Londres
tem investido nas ciclovias. E não é de hoje.
Imagem de divulgação |
O interessante é que nenhum partido político se opõe à expansão das ciclovias na capital. Pelo menos não abertamente. O projeto tem amplo apoio popular. Mas, até chegar a esse ponto, foram várias pedras no caminho. Os comerciantes reclamavam que as faixas exclusivas iriam afetar o já escasso espaço para estacionar os carros e, com isso, afastar os clientes. Talvez o grupo que tenha gritado mais tenha sido o dos motoristas de táxi. Londres é uma cidade antiga. Ao contrário de Paris, com seus largos bulevares, as ruas, principalmente do centro, são estreitas. Não foram planejadas para os carros. Os taxistas reclamam que o trânsito londrino já é caótico o bastante sem que as bicicletas atrapalhem. Reduzir o espaço ainda mais será desastroso, eles argumentam.
Protesto em Londres |
Além das ciclovias, outro projeto vai ser um sinal de que os tempos
estão mudando. De que Londres aos poucos se livra dos automóveis. Uma nova
ponte será construída sobre o Tâmisa. Uma obra especial, onde os carros não
terão vez. Setenta e quatro designs foram escolhidos. No mês que vem, a lista
será reduzida a quatro propostas. Em Julho, será anunciado o vencedor do
projeto orçado em 40 milhões de libras. A nova ponte terá uma faixa de pedestre
e uma dedicada aos ciclistas. Algumas das propostas parecem ter saído de um filme
de ficção científica. São lindíssimas e complexas.
Diga lá, se você andasse ou usasse bicicleta todo dia para ir ao
trabalho, você preferiria cruzar de ‘A’ a ‘B’ em linha reta, ou iria até o ‘Z’
antes de chegar do outro lado? Dê uma olhada nas fotos de divulgação. Se, como
eu, você preferir uma ponte retinha, então, my friend, seu caso é de caretice
total.
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